quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

VOLUNTÁRIO JORGE JONES

QUANDO A GUERRA CIVIL AMERICANA ENCONTROU A REVOLUÇÃO CONSTITUCIONALISTA

A Guerra Civil Americana



Foi um grande conflito armado, travado nos Estados Unidos da América, entre os anos de 1861 e 1865. De um lado o Norte formado por estados leais ao presidente Abraham Lincoln e do outro o Sul, ou Confederação, formado por estados denominados “rebeldes” que haviam se separado dos EUA e criado uma nova nação sob o comando de Jefferson Davis.

O Norte moderno, essencialmente urbano, detentor de 95% da capacidade industrial do país e de uma grande e moderna malha ferroviária venceu o Sul. Os Estados Confederados do Sul lutaram bravamente defendendo seu território invadido pelo “Yankees” e chegaram próximo da vitória em alguns momentos. Mas a economia agroexportadora - centrada no cultivo do algodão –, escravocrata, rural e pouco industrializada não resistiu. Um bloqueio naval foi feito pela Marinha de Guerra do Norte na costa sul americana, impedindo que o Sul importasse armas e suprimentos da Europa. Este mesmo bloqueio impedia também o Sul de continuar exportando seu algodão ao Velho Continente. O apoio militar francês e inglês, com o qual contavam os Confederados, não veio ficando assim selada a derrota sulista na guerra. Em abril de 1865 os generais confederados Robert Lee e Joseph Jonston assinaram a rendição do Sul.

O conflito deixou mais de 600 mil mortos. Foi a mais sangrenta guerra na qual se envolveu os EUA em toda a sua história.  Os estados que integraram a Confederação estavam destruídos.

Com o fim da guerra tem início a Reconstrução Americana que previa a reconstrução do Sul sob a liderança do vitorioso Norte. Os estados rebeldes foram gradualmente reintroduzidos na União. Escravos libertos com a derrota do sul ganharam direito a voto e conquistaram outros direitos antes exclusivos dos brancos. O território sulista foi militarmente invadido, civis do Norte vieram para ocupar importantes cargos públicos no Sul. Líderes confederados foram presos, outros perseguidos e muitos tiveram suas terras confiscadas. Havia muita pobreza nos antigos orgulhosos estados integrantes da Confederação. Era o fim da “Dixie Land”.


A Migração Confederada para o Brasil

Com o intuito de escapar dos horrores da derrota e da Reconstrução Americana, centenas de famílias sulistas migraram para o Brasil. As terras férteis e baratas nas quais ainda se podia ter escravos “encheram os olhos” de alguns milhares de confederados ávidos por refazerem suas vidas.  A única migração reversa da história americana trouxe ao Brasil aproximadamente 20 mil confederados entre 1865 e os primeiros anos do século XX. O Imperador Dom Pedro II foi o grande incentivador da migração dos americanos os quais, acreditava ele, poderiam melhorar as técnicas agrícolas em uso no país, sobretudo na produção do algodão.

Os americanos apresentaram aos brasileiros o arado de metal puxado por mulas, o descaroçamento automatizado do algodão, o lampião de querosene, a máquina de costura, inúmeras ferramentas e técnicas agrícolas bem como novas práticas médicas, odontológicas e de educação básica. Até mesmo a melancia da Georgia, hoje um dos produtos agrícolas mais famosos do Brasil, foi introduzida no país por esses imigrantes (um deles trouxe um punhado de sementes no bolso).

Vila Americana


Em 1886, o Coronel William Hutchinson Norris  (ex-combatente Confederado e ex-senador pelo Alabama) fundou na região de Santa Barbara D’Oeste a primeira colônia americana no interior de São Paulo. Em 1875 foi inaugurada a Estação Ferroviária de Santa Bárbara que daria forte impulso às atividades agrícolas na região, consolidando aquela como a mais importante e próspera colônia confederada no Brasil. Ao redor daquela estação se fixou um povoado que ficou conhecido como Vila Americana e que deu origem a atual cidade de Americana/SP. Essa cidade é hoje é um grande polo industrial têxtil que teve seu início com o algodão produzido pelos imigrantes americanos.


O Voluntário Jorge Jones



Com o início da Revolução Constitucionalista, em 9 de julho de 1932, milhares de jovens, de todas as partes do Estado de São Paulo correram aos postos de alistamento. Contra a Ditadura Vargas, todos queriam contribuir para o esforço cívico paulista em busca da reconstitucionalização do país. De Vila Americana partiu Jorge Jones.

Jorge era bisneto do Coronel William Norris e neto de Robert Norris, filho do Coronel,  que participara de 37 batalhas da Guerra Civil sendo inclusive ferido em combate. Jorge era filho de Cícero Jones, médico e um dos precursores da indústria têxtil de Americana que se casou, em segundas núpcias, com a filha de Robert, Martha.

Em 1902, quando Cicero e Martha estavam vivendo em Piracicaba, nasceu Jorge. A família era ainda composta por mais 8 irmãos: Robert, Yancey, Carol, Carlos, James, Franklin, Mary e Pattie.

Durante a Revolução, Jorge Jones foi incorporado ao Batalhão Patriótico 23 de Maio e serviu como ordenança do tenente Manoel dos Santos Sobrinho. Jorge, o tenente e o voluntário Aristeu Valente faziam uma patrulha, em 18 de agosto de 1932, na estada que ligava as cidades de Socorro a Lindóia (região de Monte Sião). Ao se depararem com os inimigos, que estavam em maior número, resistiram heroicamente até tombarem, os três, com seus corpos crivados de balas.

Tenente Manoel dos Santos Sobrinho

O Coronel Herculano de Carvalho fez triste referência a esse incidente em seu livro “A Revolução Constitucionalista” de 1934, à página 182:

“Todavia não fora completa a vitória: antes, enlutara-a a perda de três bravos – o tenente Sobrinho e os voluntários Aristeu Valente e Jorge Jones, sobre cujos cadáveres tripudiaram alguns desalmados”
Nº 859 – Do Comandante João Dias (Mogi-Mirim), ao Comandante Alfieri (S. Paulo) – Transmito-vos telegrama acabo de receber major Castro: “Levanto perante povos civilizados veemente protesto pelo saque infame levado a efeito por soldados da ditadura nos cadáveres do tenente Sobrinho, dos voluntários Aristeu Valente e Jorge Jones, mortos no combate de Monte Sião, e nas paupérrimas habitações que tiveram a desventura de ficar na zona de combate. Saudações. Mogi-Mirim, 20-8-932”




Os restos mortais do voluntário Jorge Jones foram enterrados no próprio campo de batalha e alguns anos depois transladados para o Cemitério da Saudade de Americana.







Bibliografia

EISENBERG, Peter Louis. Guerra Civil Americana. São Paulo,Brasiliense, 1999;

NEELEMAN, Gary. NEELEMAN, Rose. A Migração Confederada ao Brasil: Estrelas e Barras sob o Cruzeiro do Sul. Porto Alegre, EDIPUCRS, 2016;

SILVA, Herculano de Carvalho. A Revolução Constitucionalista. São Paulo, Civilização Brasileira, 1934;

MONTENEGRO, Benedito. Cruzes Paulistas: Os que Tombaram, em 1932, pela Glória de Servir São Paulo..São Paulo: Empreza Graphica da Revista dos Tribunaes, 1936

Créditos das fotos

Coronel Willian Hutchiinson Norris e Voluntário Jorge Jones: Fraternidade Descendência Americana (https://www.facebook.com/fdasbo/)


Vila Americana e Cícero Jones: Coleção de Judith Jones em A Migração Confederada ao Brasil: Estrelas e Barras sob o Cruzeiro do Sul páginas 324 e 114, respectivamente.